SENSAÇÃO DE SER UM “FARDO” É RELATADA POR 8 EM CADA 10 JOVENS QUE TENTARAM SUICÍDIO.
CCS
atualizado 1 ano atrás
Vitor Struck
Agência UEL
Uma pesquisa realizada com 80 estudantes de graduação e pós-graduação que já tentaram o suicídio apontou que a sensação de representar um “fardo” para amigos e familiares costuma ser recorrente entre as pessoas que sofrem de depressão e apresentam ideação suicida. Se o alerta for identificado a tempo, uma intervenção profissional poderá ajudar a evitar a concretização do desejo pela interrupção da própria vida, o que é visto por muitas pessoas em estado de intenso sofrimento psíquico como a única solução. Problema de saúde pública que registra números cada vez mais alarmantes, o fenômeno é tema da campanha Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio, e cujo tema neste ano é “Se precisar, peça ajuda”.
De acordo com a docente do Departamento de Enfermagem da UEL e membro do Grupo de Estudos, Práticas e Pesquisa em Saúde Mental (GEPPSAM), Fernanda Machado, autora do estudo, oito em cada dez participantes que responderam ao questionário voltado à identificação da motivação suicida relataram a sensação. Este grupo foi formado, em sua maioria, por jovens que tinham entre 20 e 23 anos e pessoas do sexo feminino. A ampla maioria (72%) ainda residia com a família no momento da aplicação dos questionários.
“Um alerta”, diz a pesquisadora, uma vez que o sofrimento psíquico é mais difícil de ser identificado. “Não é um corte ou algo físico. As dores da mente são muito subjetivas e, às vezes, banalizadas por nós”, diz.
Estes e outros dados regionais são parte do projeto de pesquisa “Avaliação dos fatores associados à motivação suicida e à saúde mental em jovens adultos”, iniciada em seu doutorado em 2021. Com foco na prevenção, orientação e capacitação de profissionais, o projeto tem o objetivo de validar versões brasileiras de duas escalas internacionais usadas para medir a sintomatologia depressiva em estudantes, etapa que já foi concluída.
Dados da plataforma DataSus (Governo Federal) divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam que 14,3 mil pessoas cometeram suicídio no Brasil, somente em 2021. O perfil mais recorrente foi o grupo de mulheres que possuíam entre 20 e 40 anos.
“Suicidômetro”
Atualmente, explica Machado, as escalas “Inventory of Motivations for Suicide Attempts (IMSA)” e “University Student Depression Inventory (USDI)” são balizadores importantes para profissionais de saúde, que apresentam boa confiabilidade na identificação das principais motivações para o suicídio e sintomas de depressão, respectivamente. Até o início de setembro, ela indica que 334 alunos responderam ao USDI e 80 jovens adultos ao IMSA. O objetivo é continuar aplicando os testes, ampliando ainda mais a pesquisa para moradores de diferentes regiões do País.
“Fizemos o processo de adaptação transcultural, ou seja, adaptamos as escalas para a versão brasileira, principalmente, em relação ao conteúdo e os termos delas. Agora, precisamos fazer o processo de validação, que é um pouquinho mais complexo. O Brasil tem uma diversidade cultural muito grande e a maioria das pessoas que responderam era daqui do Sul, então é possível que continuemos o processo de análise estatística voltado para cada região”, adianta.
No caso do grupo de 334 estudantes que responderam ao USDI, os resultados também são importantes, destaca Machado. A pesquisa apontou que mais de 50% dos alunos relataram conviverem com uma sensação de esgotamento mental e físico, e que “frequentemente se sentem mais cansados do que o normal”, diz.
Docente do Departamento de Enfermagem da UEL, Fernanda Machado (Foto: Arquivo pessoal).
O mesmo contingente de participantes informou que alterações de humor são recorrentes e acabam por atrapalhar o desempenho acadêmico na graduação e na pós-graduação. “Mais de 50% dos alunos relataram que frequentemente sentem que o mau humor afeta a habilidade de realizar algumas tarefas. O que sabemos é que o fato de não dormir bem influencia no nosso humor, consequentemente teremos um nível de estresse maior e não vamos ter um bom rendimento, que é o que estamos percebendo”, avalia.
Ao responderem os questionários, os participantes receberam listas com os contatos dos principais serviços de apoio e acolhimento, além do contato pessoal da enfermeira Fernanda Machado, que é especialista em Saúde Mental. Este trabalho foi realizado em parceria com o professor Marcos Hirata Soares, docente do Departamento de Enfermagem, do Centro de Ciências da Saúde (CCS).
Outro objetivo importante da pesquisadora é desenvolver um site para reunir informações, orientações e relatos de pessoas que passaram por situações parecidas. “Não conseguir ter acesso a todas essas pessoas que responderam às pesquisas, para saber como elas estavam, era algo que me incomodava. Então, o site vai ser um meio de ofertar informações relevantes, com relatos de pessoas. Vai ser um meio de comunicação com diversas informações. Como lidar, o que falar, como agir, o que pode ser publicado e o que falar para uma pessoa. Tudo isso vai estar disponível para ajudar profissionais de saúde, estudantes, a comunidade como um todo”, diz.
Serviço
Estudantes, servidores, docentes e comunidade externa podem solicitar atendimento psicológico na Clínica Psicológica da UEL, entrando em contato pelo telefone (43) 3371-4237. A equipe mantém atualizados os canais de comunicação e disponibiliza uma série de conteúdos e orientações importantes voltadas para crianças, adolescentes, adultos, idosos, casais e à comunidade LGBTQIA+.