Lei da Igualdade Salarial leva mulheres e empresas à Justiça em oito meses

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atualizado 8 meses atrás


Do lado das trabalhadoras, a exigência é que se pague a elas a mesma remuneração dos homens em igual função. Já as companhias contestam a divulgação de dados internos, por meio de relatórios entregues ao Ministério do Trabalho e Emprego, que poderiaM expor informações sigilosas e afetar a reputação.

As demandas por salário igual baseadas na nova lei somaram ao menos 58 processos no Judiciário trabalhista de julho de 2023 a março de 2024, segundo levantamento feito pela Deep Legal, plataforma especializada em inteligência artificial e gestão preditiva.

O estudo foi realizado a partir de um banco de dados com cerca de 200 milhões de processos, por meio de uma ferramenta de busca textual e semântica desenvolvida pela empresa. “Com uso de tecnologias como Big Data e Inteligência Artificial, foi possível mapear os processos que utilizaram a fundamentação da nova lei”, explica Vanessa Louzada, gerente executiva da Deep Legal.

Segundo ela, a ferramenta conseguiu mapear ainda que advogados já vêm citando a nova lei em processos antigos, baseados no artigo 461 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que já previa a medida.

Ainda conforme o levantamento, os TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) da 12ª Região, em Santa Catarina, e da 2ª Região, em São Paulo, são os que mais concentram as demandas relacionadas ao tema.

A partir do número da lei e de expressões como “igualdade salarial” e “critérios remuneratórios entre mulheres e homens” foi possível relacionar os processos. Até o final de fevereiro, no entanto, não havia nenhuma sentença favorável às mulheres com base na nova legislação.

No caso das empresas, no entanto, já há vitórias judiciais. A 4ª Turma do TRT da 6ª Região, em Minas Gerais, atendeu pedido da Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) e concedeu liminar determinando a suspensão da obrigatoriedade de entrega do relatório de transparência e igualdade salarial ao MTE.

Segundo a decisão, todas as pessoas jurídicas, indústrias ou não, que tenham mais de cem empregados ficam desobrigadas da publicação do relatório.

O documento passou a ser exigido para empresas que tenham cem ou mais funcionários com carteira assinada em julho do ano passado. O prazo para entrega já terminou e os primeiros dados foram divulgados pelo governo federal na segunda-feira (26).

Pelos números, mulheres ganham 19,4% menos em comparação aos homens que exercem igual função.

Os debates sobre a nova lei já chegaram ao STF (Supremo Tribunal Federal), que deve decidir sobre o tema ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) da CNI (Confederação Nacional da Indústria) e da CNC (Confederação Nacional de Bens, Serviços e Turismo).

A advogada Priscila Kirchhoff, sócia do Trench Rossi Watanabe, afirma que os danos à reputação são mais relevantes para as companhias do que qualquer valor financeiro estipulado pela legislação.

Segundo a Lei da Igualdade Salarial, empresas que descumprirem as normas podem pagar multas que vão de 3% da folha de pagamento do empregador até o limite de cem salários mínimos, cerca de R$ 140 mil hoje.

Para ela, as companhias devem fazer uma avaliação profunda, caso a caso, antes de ir à Justiça contra a lei ou de divulgar qualquer dado comprometedor.

“Pode afetar uma empresa de forma profunda e, por vezes, até permanente. No caso dos relatórios, os riscos vêm dos dois lados: se a empresa optar por judicializar a medida, pode ser considerada não transparente; se decidir publicar e houver distorções salariais, pode ser acusada de discriminação”, diz.

Vanessa, da Deep Legal, afirma que política de remuneração salarial tem gerado debates em todo o mundo sobre igualdade de gênero. Para ela, embora prevista na CLT, a medida é mais ampla após o texto da nova lei.

“A equiparação salarial já prevista na CLT e na Constituição Federal, infelizmente, não é integralmente cumprida. Para tanto, a lei 14.611 é perspicaz ao trazer a necessidade da transparência dos critérios remuneratórios por função, cargos, etc. através dos relatórios, prevendo penalizações em multas. Esses relatórios não ferem a privacidade”, diz.

Segundo o Relatório Global sobre Diferença de Gênero 2023, realizado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupa a 57ª posição no ranking de igualdade salarial entre homens e mulheres que exercem trabalhos semelhantes de um total de 146 países.

No mundo, serão necessários 131 anos para se alcançar a plena equidade entre os gêneros. “A igualdade de remuneração é um dos temas mais relevantes no debate sobre a paridade de gênero em todo o mundo”, afirma Vanessa.

Levantamento do Trench Rossi Watanabe mostra que a obrigação da transparência salarial já é implementada em diversos países do mundo como Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Islândia, Itália, Lituânia, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Portugal, Suécia, Suíça e Reino Unido, Canadá, Chile e Estados Unidos.

O QUE DIZEM AS LEIS SOBRE IGUALDADE SALARIAL NO MUNDO:

– Permitem que os empregados solicitem e acessem informações sobre os níveis salariais da empresa

– Exigem que as empresas divulguem informações salariais individuais a seus empregados

– Exigem que as empresas divulguem o salário de um cargo anunciado aos candidatos, durante o processo de entrevista ou em anúncios de emprego

– Proíbem empresas de solicitar o histórico salarial de um empregado ou de um possível empregado

– Criam órgão independente para fornecer aos empregadores uma certificação de igualdade de remuneração se eles atenderem a determinados requisitos de remuneração neutra em termos de gênero

– Obrigam as empresas com um determinado número mínimo de empregados (por exemplo, 50) a publicar informações sobre gênero e remuneração em sua organização; no Brasil, o número é cem

– Determinam a realização de auditorias regulares de gênero e remuneração em empresas com um número mínimo de empregados

– Incentivam a discussão sobre igualdade de remuneração e auditorias salariais durante a negociação coletiva

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