Água Viva — uma obra abstrata
Revista Jornalismo & Ficção
atualizado 2 meses atrás

Obra escrita por Clarice Lispector em seus 53 anos, publicada pela editora Rocco. Esse livro é uma prova do porquê a escritora entrou para a história da nossa literatura. Uma das principais reclamações dos que consumiram a obra é a escrita desconexa, que difere da forma como Lispector escrevia em outras narrativas e de suas crônicas como jornalista para o Jornal do Brasil.
Por Ignez Cardoso
“Mas escrever para mim é frustrador: ao escrever lido com o impossível”
Lispector, 1973, p.60
Classificado pela autora como ficção, alguns estudiosos o veem como uma obra abstrata, assim como as pinturas que Clarice produzia. Trazendo somente duas figuras: o eu feminino e o você masculino. Segundo a primeira pessoa, o texto trata de uma carta que o você nunca irá receber, mas que o eu sente a necessidade de escrever como se fosse um desabafo.
“O que pintei nessa tela é passível de ser fraseado em palavras? Tanto quanto posso ser implícita a palavra muda no som musical”
Lispector, 1973, p.09
A obra é um grande destrinchar de pensamentos, sentimentos e percepções individuais pela vida que afeta cada leitor de uma maneira pessoal. Uma das principais reclamações dos que consumiram a obra é a escrita desconexa, que difere da forma como Lispector escrevia em outras narrativas e de suas crônicas como Jornalista para o Jornal do Brasil.
“Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa”.
É nessa confusão onde mora o que nos conecta com o “enredo”, a complexidade das ideias apresentadas faz com que continuemos a ler, tentando compreender. Muitos justificam que essa dificuldade decorre do choque com a escrita não convencional e inédita que Clarice inaugura nesta obra.
Dizem que Água Viva é uma das principais fontes para entender a pessoa Clarice Lispector, tendo em vista o tom de personalidade notório na obra, além da forte sensibilidade, sendo uma das principais marcas da autora.
Diferente do convencional, o sentimentalismo apresentado no livro foge do que pensamos, trazendo uma abordagem única sobre o sentir pessoal, sendo focado no que o eu feminino pensava e sentia complexamente.
Alguns desses sentir que Clarice narra reflete o quão complexa é a mente humana quando nos questionamos sobre quem somos profundamente. Como no trecho:“E vejo que sou intrinsecamente má. É somente por pura bondade que sou boa. Derrotada por mim mesma” (Lispector, 1973, p. 58). Refletindo sobre a moralidade humana tão complexa quanto a escrita da autora nessa obra.
Ignez Cardoso é estudante de Jornalismo na UEL, participa do Grupo Gabo de Pesquisa, com o projeto de IC: Clarice Lispector — Jornalista e escritora e da Revista Jornalismo & Ficção na América Latina.
Tainara Gomes é estudante do curso Design Gráfico da UEL. Estagiária responsável pelas redes sociais e toda comunicação tanto digital quanto física do sistema de bibliotecas da UEL. Participa do Grupo Gabo de Pesquisa e da revista Jornalismo e Ficção na América Latina.