Cem anos de solidão em breve na Netflix

Revista Jornalismo & Ficção


atualizado 1 ano atrás


Gabo sempre relutou em permitir a filmagem de Macondo e seus personagens, porque a história é longa e não caberia em um filme. Mas agora está oficializado: a cultuada obra do colombiano será adaptada para a linguagem cinematográfica pelos seus filhos. A série terá cerca de 20 horas, distribuídas em três temporadas

Samir Kadri

Com o anúncio da adaptação do livro Cem anos de solidão para a plataforma em streaming, levantou-se a polêmica relacionada ao fato de Gabriel García Márquez tê-la recusado em vida. A série tem produção executiva dos seus filhos, Rodrigo e Gonzalo García, que já atuam no ramo cinematográfico e trabalham com o roteirista porto-riquenho José Rivera (diários de motocicleta e na estrada) na adaptação. Agora está oficializado que a cultuada obra do colombiano vencedor do prêmio Nobel de 1982 será encenada por atores. Quais são as expectativas? O que há de se esperar de cem anos diferente de grandes sucessos como Harry Potter, Game of Thrones e O Senhor dos Anéis?

Por que o autor não queria a história encenada?

Gabo nunca quis que sua obra prima fosse adaptada para o audiovisual. Seu desejo era de que a imaginação do leitor fosse estimulada pela linguagem figurativa do livro, proporcionando-lhe uma experiência impossível de se realizar por qualquer outra linguagem.

O autor, jornalista de origem, sempre teve apreço pelo cinema: “A princípio, quis ser diretor. A única coisa que realmente estudei foi cinema”, disse em entrevista. Em 1955, chegou a se matricular no Centro Experimental de Cinematografia de Roma. Durante sua carreira, foi roteirista de alguns filmes e ajudou a fundar a Escola Internacional de Cinema e Televisão de San Antonio de Los Baños. Portanto, sendo cinéfilo e tendo outras obras adaptadas para o cinema, Gabo parecia ter boa noção do que fazia ao recusar a adaptação de seu livro mais famoso.

A peculiaridade de Cem Anos

A história é banhada pelo Realismo Mágico, característico da América Latina durante o século XX. Outras escritas do autor também se encaixam no gênero. Entretanto, Gabo negava que Cem anos de solidão pertencesse à essa corrente. Isso demonstra uma peculiaridade do romance e retratá-lo será um imenso desafio a seus filhos e a quem estiver envolvido com a realização da série.

Como os elementos mágicos, expostos em uma narrativa tão difícil, com tantos personagens, poderá ser projetada em imagens, como serão inseridos na produção as nuances de magia? Este, com certeza, será o ponto mais interessante de se observar. Espera-se que os irmãos García-Barcha consigam fazer esta tradução da forma mais fiel possível, para que a narrativa não perca seus mistérios.

O efeito Harry Potter

A adaptação de histórias fantásticas, dos livros para o audiovisual, demonstrou ser uma grande fórmula de sucesso, tanto para quem escreve, quanto para quem filma.

Nas últimas duas décadas, gerações foram marcadas pelo sucesso das sagas Harry Potter, O Senhor dos anéis e Game of thrones, superproduções campeãs de audiência que despertaram em jovens e adultos do mundo todo o interesse pela leitura. Cem anos de solidão tem grandes diferenças em relação a tais obras. Entretanto, a semelhança pode estar neste efeito projetivo que o audiovisual pode proporcionar. Um livro vencedor do prêmio Nobel e considerado por muitos a segunda maior obra já escrita em língua espanhola, atrás apenas de Dom Quixote, sendo retratado mundialmente pela plataforma mais famosa do momento, tem grandes chances de despertar o interesse pela leitura de milhares de pessoas. Sob esse ponto de vista, tendo-se a crença de que ocorrerá o mesmo efeito dos exemplos citados, a série tem tudo para ser um enorme sucesso.

Um expoente da cultura latino-americana

As produções faladas em língua espanhola têm tido grande sucesso na Netflix. Roma, filme dirigido por Alfonso Cuarón, foi um dos destaques do Oscar 2019. Narcos, série dirigida em sua primeira temporada pelo brasileiro José Padilha, também se destaca. No ramo da música, o reggaeton tem se popularizado mundialmente e dominado as paradas nos últimos anos e a brasileira Anitta teve sua música Envolver como a mais escutada no mundo. A cultura latino-americana está na moda, e o bom momento pode ser uma oportunidade para Rodrigo e Gonzalo colocarem a obra de seu pai num patamar de grande audiência, além de entusiasmar novas leitura sobre o cem anos de solidão.


Samir Kadri é formado em jornalismo da Universidade Estadual de Londrina. Membro do projeto Jornalismo e Ficção desde 2019, no qual se especializou na temática do cinema e produziu uma série de crônicas. Já foi estagiário no núcleo de comunicação da Prefeitura Municipal de Londrina e redator na agência de publicidade BW8. E-mail: samir.kadri7@gmail.com

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