Ashes and Snow: Um convite à obra de Gregory Colbert

Por Leonardo W. Soares de Melo


atualizado 3 anos atrás


Introdução

Meu intuito com este manuscrito foi divulgar a obra fotográfica e audiovisual de Gregory Colbert. Este é um artista canadense reconhecido por trabalhos evidenciando animais, povos e culturas enquanto celebrações da natureza. Seus cliques podem ser caracterizados como expressões da colaboração entre humanos e outros animais, expressando sensibilidades poéticas e um desejo de que todas as espécies participem de uma grande conversa universal em prol do equilíbrio da convivência.

Fonte: Gregory Colbert (2002).

Ao empreender uma visão não hierarquizada do mundo natural, Colbert celebra os sons, as cores e o toque da natureza como um conjunto orquestral. Conforme aborda em seu site oficial, “Os cientistas podem nos ajudar a entender o mundo natural, dando-nos o ‘como’” […] e “é papel dos artistas em todas as disciplinas criativas tentar inspirar um ‘porquê’ transformacional” (COLBERT, 2022, s. p.). Nesse sentido, sua perspectiva rompe frontalmente com as visões de mundo antropocentristas, defendendo a urgência de um novo pacto natural entre humanos, outras espécies e o solo sobre o qual coabitamos. 

Sua exposição fotográfica e audiovisual mais aclamada, e ainda em andamento, é intitulada “Ashes and Snow”. É composta por “obras de arte fotográficas, um filme de uma hora e dois curtas-metragens ‘haikus’ e um romance em letras, todos apresentados em uma estrutura temporária construída especificamente chamada Museu Nômade” (COLBERT, 2022, s.p.).

Da sensibilidade da obra de Colbert emerge uma crítica sofisticada às relações assimétricas que estabelecemos com o mundo. De fato, conforme lembrou Bruno Latour (2004), a crise ecológica atual emerge não somente das mudanças climáticas experimentadas e de outras respostas do solo mundo diante de nossa interferência destrutiva, mas da própria clivagem entre mundo natural e mundo social, que, por séculos, temos empreendido culturalmente.

Fonte: Gregory Colbert (2002).

Isso remete ao que abordou Michel Serres (1990) sobre nossa dificuldade em apreender a natureza: “Certamente, ignoramos a linguagem do mundo, ou não conhecemos dela senão diversas versões animistas, religiosas ou matemáticas” (p. 69). Contudo, a natureza nos fala por outros meios e cabe a nós angariar formas para apreendê-los, em sentido de efetivar um novo contrato de convivência. Penso que a sensibilidade da obra de Gregory Colbert é um desses formatos possíveis, exprimindo de maneira admirável “toda a orquestra da natureza” (COLBERT, 2022, s.p.). 

Referências

GOLBERT, Gregory. Site oficial. Disponível em: https://gregorycolbert.com/project/ashes-and-snow/. Acesso em 04 fev. 2022.

LATOUR, Bruno. Políticas da natureza: como fazer ciência na democracia. Bauru: EDUSC, 2004.

SERRES, Michel. O contrato natural. Lisboa: Instituto Piaget, 1994. 

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