Presença da vítima em audiência de retratação é opcional, diz maioria do STF

LESFEM


atualizado 2 anos atrás


Por José Higídio, via ConJur.

A garantia da liberdade só existe se a mulher puder apenas solicitar a audiência de retratação prevista no artigo 16 da Lei Maria da Penha. Determinar o comparecimento da vítima a essa audiência significa violar sua intenção e, portanto, discriminá-la.

Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal formou maioria nesta segunda-feira (21/8) para reconhecer a inconstitucionalidade da designação, de ofício, de tal audiência por parte do juiz, além de afastar a interpretação segundo a qual o não comparecimento da vítima de violência doméstica implica renúncia ao direito de representação. A sessão virtual se encerrará oficialmente às 23h59 desta segunda.

Contexto
O artigo 16 da Lei Maria da Penha prevê que, nas ações penais públicas por lesão corporal leve e lesão culposa — que são condicionadas à representação da vítima —, a renúncia à representação só pode ser admitida perante o juiz, em uma audiência designada especialmente para isso, antes do recebimento da denúncia e após manifestação do Ministério Público.

A ação direta de inconstitucionalidade julgada pelo STF foi ajuizada no último ano pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp). A entidade pediu que o Supremo garantisse a continuidade das ações penais nos casos em que a vítima de violência doméstica não comparecesse à audiência de retratação.

Segundo a Conamp, o não comparecimento da vítima a tal audiência vinha sendo interpretada como renúncia tácita, com extinção da punibilidade do agressor e arquivamento do processo.

Na visão da entidade, esse entendimento viola os princípios da dignidade da pessoa humana e do devido processo legal, além de retirar do MP a titularidade exclusiva para promover ação penal pública.

Conforme a autora da ação, o objetivo da audiência é a verificação do real desejo da vítima de retirar a representação contra o agressor, e não a sua confirmação.

Fundamentação
Prevaleceu o voto do ministro Edson Fachin, relator da ADI. Até o momento, ele já foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Kassio Nunes Marques, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Luiz Fux.

De acordo com Fachin, o artigo 16 da lei “não deve ser lido de forma isolada, como se contivesse apenas dispositivos dirigidos ao juiz”, pois faz parte de um conjunto de normas voltadas ao atendimento por equipe multidisciplinar. Ele apontou que tal sistema é mais eficaz para enfrentar a violência doméstica, já que “viabiliza o conhecimento das causas e os mecanismos” do problema.

Assim, segundo o magistrado, a função da audiência não é apenas “avaliar a presença de um requisito procedimental”, mas permitir que a vítima, ajudada por uma equipe multidisciplinar, possa se manifestar livremente e expressar sua vontade.

“Não cabe ao juiz delegar a realização da audiência para outro profissional, nem cabe ao juiz designar, de ofício, a audiência”, concluiu o relator. Para Fachin, qualquer interpretação de que a audiência é obrigatória “viola o direito à igualdade, porque discrimina injustamente a vítima de violência”.

Leia também

Lesfem realizará o II Simpósio sobre Feminicídios

A Universidade Estadual de Londrina (UEL) tem o prazer de anunciar o II Simpósio sobre Feminicídios: Reflexões sobre Incidências e (In)visibilidades, que ocorrerá de 23 a 25 de outubro de 2024, em Londrina/PR. Este evento será realizado pelo Laboratório de Estudos de Feminicídios (LESFEM) que reúne especialistas de renomadas instituições como UEL, UFBA e UFU.  […]


Segundo Portal da Transparência do CNJ, a Justiça do DF recebe 574 pedidos de medidas protetivas por violência contra a mulher a cada ano

Violência contra mulher: 574 vítimas pedem medidas protetivas por ano

Por ano, no Distrito Federal, uma média de 574 vítimas de violência contra a mulher requerem medidas protetivas de urgência a cada ano. Concedidas pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), as medidas protetivas de urgência são baseadas na Lei Maria da Penha. Dados do Portal da Transparência do Conselho Nacional de Justiça […]


O aumento nos casos em diversos estados nos alerta para a urgência de ações eficazes na prevenção contra a mulher

Monitor de Feminicídos do Brasil Revela aumento alarmante e Estatísticas Preocupantes 

O Monitor de Feminicídios no Brasil divulgou os dados atualizados de 2024, revelando um aumento alarmante nos casos de feminicídios em todo o país. Segundo os números mais recentes, foram registrados 750 feminicídios consumados e 1693 casos de feminicídios consumados e tentados até o momento.  Destacando-se entre os estados mais afetados, São Paulo lidera com […]


É o que mostra o Atlas da Violência, com base em registros do SUS de 2022 — quando mais de 144 mil mulheres foram atacadas

Atlas da Violência mostra que a cada 46 minutos ocorreu um estupro no Brasil em 2022

Um estupro ocorreu a cada 46 minutos no país, em 2022. A constatação é do Atlas da Violência, publicado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Com base nos registros do Sistema Único de Saúde (SUS) daquele ano, mais de 144 mil mulheres foram vítimas de algum […]